Nas postagens anteriores vimos fórmulas para determinar as raízes de polinômios de graus $1$, $2$, $3$ e $4$. No caso dos polinômios de grau $1$ é bem facil determinar sua raiz. No caso dos polinômios de grau $2$, temos a Fórmula de Bhaskara que é capaz de fornecer as raízes de qualquer polinômio de grau $2$. Já no caso dos polinômios de graus $3$ e $4$ temos a Fórmula de Tartaglia e a Fórmula de Ferrari, respectivamente, que são bem complicadas de serem usadas. Para os polinômios de grau $5$ em diante nem existe uma fórmula que forneça as raízes desses polinômios. Diante disso, percebemos que faz muito sentido e que é muito importante conhecermos métodos alternativos para calcular as raízes de um polinômio. Essa postagem está aqui para isso, para que você conheça um método alternativo para determinar as raízes de um polinômio. Nela eu vou te apresentar o Teorema das Raízes Racionais. Ele não é uma fórmula, mas ele é capaz de fornecer candidatos a raízes de um polinômio qualquer que tenha coeficientes inteiros. Vamos agora conhecê-lo a prender como aplicá-lo.
O Teorema das Raízes Racionais
Teorema (Teorema das raízes racionais): Seja $p(x)$ um polinômio dado por
$$p(x) = a_nx^n+a_{n-1}x^{n-1}+ \cdots + a_1x+a_0$$
onde $a_n, \dots, a_0$ são números inteiros. Se $\displaystyle\frac{r}{s} \in \mathbb{Q}$, na forma irredutível, é uma raiz de $p(x)$, então $r$ divide $a_0$ e $s$ divide $a_n$.
Esse teorema não garante a existênca de uma raiz racional para o polinômio $p(x)$, ele diz que se $p(x)$ possui alguma raiz racional na forma irredutível $\displaystyle\frac{r}{s}$, então, obrigatoriamente, $r$ tem que dividir o $a_0$ (termo independente) e o $s$ tem que dividir o $a_n$ (termo dominante). Se ele não garante a existência dessa raiz racional, como podemos usá-lo? Usamos esse teorema da seguinte forma: primeiramente verificamos se o polinômio $p(x)$ possui coeficientes inteiros. Depois identificamos o número $n$, que é o grau do polinômio para podermos identificar os coeficientes $a_0$ e $a_n$. Em seguida determinamos todos os divisores de $a_0$ que serão os possíveis $r$ e todos os divisores de $a_n$ que serão os possíveis $s$. Conhecendo as possibilidades para $r$ e para $s$, o próximo passo é montar as frações $\displaystyle\frac{r}{s}$ com as possibilidades que encontranmos para $r$ e para $s$. Agora, o Teorema das Raízes Racionais nos diz que, se o polinômio $p(x)$ possui uma raiz racional, ela vai ter que ser uma das possibilidades de $\displaystyle\frac{r}{s}$ que econtramos. Assim, o último passo é aplicar o polinômio $p(x)$ em cada $\displaystyle\frac{r}{s}$ que encontramos para verificar qual dessas possibilidades é uma raiz. Observe que esse teorema só fornece candidatos a raízes que são racionais, ou seja, se o polinômio tiver raízes irracionais ou complexas, estas não vão aparcer como candidatas a raízes. Isto significa que esse teorema nem sempre fornece todas raízes de um polinômio. Caso entre os candadatos a raízes não haja nenhuma raiz, isso significa que o polinômio possui somente raízes irracionais ou complexas.
Vamos ver por meio de exemplos como aplicar o teorema das raízes racionais para determinar algumas raízes de um polinômio.
Exemplos:
1. Usando o teorema das raízes racionais, determine as raízes racionais do polinômio $p(x) = 2x^4-2x^3-3x^2-x-2$.
Solução: A primeira coisa que devemos verificar é se o polinômio possui coeficientes inteiros. Como o polinômio $p(x)$ possui os coeficientes inteiros, podemos aplicar o Teorema das Raízes Racionais. Temos que $n=4$, assim $a_4 = 2$ e $a_0=-2$. Agora vamos determinar os divisores de $a_0 = -2$ que serão os $r$ e os divisores de $a_4 = 2$ que serão os $s$. Desse modo, os possíveis $r$ são $\{\pm 1, \pm 2\}$ e os possíveis $s$ são $\{\pm 1, \pm 2\}$. Para obter as possiblidades para $\displaystyle\frac{r}{s}$, basta montar a possíveis frações com todas as possibilidades de $r$ e de $s$. Assim, as possibilidades de $\displaystyle\frac{r}{s}$ são
$$\left\{\pm 1, \pm \displaystyle\frac{1}{2}, \pm 2 \right\}.$$
Agora vamos testar as possibilidades que encontramos para $\displaystyle\frac{r}{s}$. Temos
\begin{eqnarray} p(1) &=& 2 \cdot 1^4 - 2 \cdot 1^3 - 3 \cdot 1^2 - 2 \\ &=& 2 - 2 - 3 - 1 - 2 = -6 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} p(-1) &=& 2 \cdot (-1)^4 - 2 \cdot (-1)^3 - 3 \cdot (-1)^2 - (-1) - 2 \\ &=& 2 + 2 - 3 + 1 - 2 = 0 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} p\left(\displaystyle\frac{1}{2}\right) &=& 2 \cdot \left(\displaystyle\frac{1}{2}\right)^4 - 2 \cdot \left(\displaystyle\frac{1}{2}\right)^3 - 3 \cdot \left(\displaystyle\frac{1}{2}\right)^2 - \left(\displaystyle\frac{1}{2}\right) - 2 \\ &=& 2 \cdot \displaystyle\frac{1}{16} - 2 \cdot \displaystyle\frac{1}{8} - 3 \cdot \displaystyle\frac{1}{4} - \displaystyle\frac{1}{2} - 2 \\ &=& \displaystyle\frac{1}{8}-\displaystyle\frac{1}{4}-\displaystyle\frac{3}{4}-\displaystyle\frac{1}{2}-2 \\ &=& -\displaystyle\frac{27}{8} \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} p\left(-\displaystyle\frac{1}{2}\right) &=& 2 \cdot \left(-\displaystyle\frac{1}{2}\right)^4 - 2 \cdot \left(-\displaystyle\frac{1}{2}\right)^3 - 3 \cdot \left(-\displaystyle\frac{1}{2}\right)^2 - \left(-\displaystyle\frac{1}{2}\right) - 2 \\ &=& 2 \cdot \displaystyle\frac{1}{16} + 2 \cdot \displaystyle\frac{1}{8} - 3 \cdot \displaystyle\frac{1}{4} + \displaystyle\frac{1}{2} - 2 \\ &=& \displaystyle\frac{1}{8}+\displaystyle\frac{1}{4}-\displaystyle\frac{3}{4}+\displaystyle\frac{1}{2}-2 \\ &=& -\displaystyle\frac{15}{8} \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} p(2) &=& 2 \cdot 2^4 - 2 \cdot 2^3 - 3 \cdot 2^2 - 2 \\ &=& 2 \cdot 16 - 2 \cdot 8 - 3 \cdot 4 - 2 - 2 \\ &=& 32-16-12-2-2 = 0 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} p(-2) &=& 2 \cdot (-2)^4 - 2 \cdot (-2)^3 - 3 \cdot (-2)^2 - (-2) - 2 \\ &=& 2 \cdot 16 - 2 \cdot (-8) - 3 \cdot 4 - (-2) - 2 \\ &=& 32+16-12+4-2 = 38 \end{eqnarray}
Como $p(-1)=0$ e $p(2)=0$, as raízes racionais do polinômio $p(x)$ são $-1$ e $2$.
Observe que, nesse exemplo, não estamos afirmando que essas são as únicas raízes do polinômio $p(x)$, estas são apenas suas raízes racionais. Como o grau desse polinômio é $4$, ele pode ter mais duas raízes reais que não são racionais. Nas postagens seguintes veremos como determinar todas as raízes reais de um polinômio. Vamos para mais um exemplo.
2. Calcule as raízes racionais do polinômio $f(x) = 3x^5-x^4+9x^3-3x^2+6x-2$.
Solução: Como este polinômio possui coeficientes inteiros, podemos aplicar o Teorema das Raízes Racionais. Nesse caso temos $n = 5$, $a_5 = 3$ e $a_0 = -2$. Agora vamos determinar os divisores de $a_0 = -2$ que serão os $r$ e os divisores de $a_5 = 3$ que serão os $s$. Assim, os possíveis $r$ são $\{\pm 1, \pm 2\}$ e os possíveis $s$ são $\{\pm 1, \pm 3\}$. As possíveis raízes racionais desse polinômio são as frações $\displaystyle\frac{r}{s}$ passando por todas as possibilidades de $r$ e de $s$. Logo, as possíveis raízes de $f(x)$ são
$$\left\{\pm 1, \pm \frac{1}{3}, \pm 2, \pm \frac{2}{3}\right\}.$$
Vamos aplicar $f(x)$ em cada possibilidade de raiz racional para verificar se esse polinômio possui raiz racional.
\begin{eqnarray} f(1) &=& 3 \cdot 1^5 - 1^4 + 9 \cdot 1^3 - 3 \cdot 1^2 + 6 \cdot 1 -2 \\ &=& 3 - 1 + 9 - 3 + 6 -2 = 12 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} f(-1) &=& 3 \cdot (-1)^5 - (-1)^4 + 9 \cdot (-1)^3 - 3 \cdot (-1)^2 + 6 \cdot (-1) -2 \\ &=& -3 - 1 - 9 - 3 - 6 -2 = -24 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} f\left(-\displaystyle\frac{1}{3}\right) &=& 3 \cdot \left(-\displaystyle\frac{1}{3}\right)^5 - \left(-\displaystyle\frac{1}{3}\right)^4 + 9 \cdot \left(-\displaystyle\frac{1}{3}\right)^3 - 3 \cdot \left(-\displaystyle\frac{1}{3}\right)^2 + 6 \cdot \left(-\displaystyle\frac{1}{3}\right) - 2 \\ &=& - 3 \cdot \displaystyle\frac{1}{243} - \displaystyle\frac{1}{81} - 9 \cdot \displaystyle\frac{1}{27} - 3 \cdot \displaystyle\frac{1}{9} - 6 \cdot \displaystyle\frac{1}{3}- 2 \\ &=& -\displaystyle\frac{1}{81}-\displaystyle\frac{1}{81}-\displaystyle\frac{1}{3}-\displaystyle\frac{1}{3}-2 - 2 \\ &=& -\displaystyle\frac{380}{81} \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} f\left(\displaystyle\frac{1}{3}\right) &=& 3 \cdot \left(\displaystyle\frac{1}{3}\right)^5 - \left(\displaystyle\frac{1}{3}\right)^4 + 9 \cdot \left(\displaystyle\frac{1}{3}\right)^3 - 3 \cdot \left(\displaystyle\frac{1}{3}\right)^2 + 6 \cdot \left(\displaystyle\frac{1}{3}\right) - 2 \\ &=& 3 \cdot \displaystyle\frac{1}{243} - \displaystyle\frac{1}{81} + 9 \cdot \displaystyle\frac{1}{27} - 3 \cdot \displaystyle\frac{1}{9} + 6 \cdot \displaystyle\frac{1}{3}- 2 \\ &=& \displaystyle\frac{1}{81}-\displaystyle\frac{1}{81}+\displaystyle\frac{1}{3}-\displaystyle\frac{1}{3}+2 - 2 \\ &=& 0 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} f(2) &=& 3 \cdot 2^5 - 2^4 + 9 \cdot 2^3 - 3 \cdot 2^2 + 6 \cdot 2 -2 \\ &=& 3 \cdot 32 - 16 + 9 \cdot 8 - 3 \cdot 4 + 6 \cdot 2 -2 \\ &=& 96 - 16 + 72 - 12 + 12 - 2 = 150 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} f(-2) &=& 3 \cdot (-2)^5 - (-2)^4 + 9 \cdot (-2)^3 - 3 \cdot (-2)^2 + 6 \cdot (-2) -2 \\ &=& -3 \cdot 32 - 16 - 9 \cdot 8 - 3 \cdot 4 - 6 \cdot 2 -2 \\ &=& -96 - 16 - 72 - 12 - 12 - 2 = 210 \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} f\left(\displaystyle\frac{2}{3}\right) &=& 3 \cdot \left(\displaystyle\frac{2}{3}\right)^5 - \left(\displaystyle\frac{2}{3}\right)^4 + 9 \cdot \left(\displaystyle\frac{2}{3}\right)^3 - 3 \cdot \left(\displaystyle\frac{2}{3}\right)^2 + 6 \cdot \left(\displaystyle\frac{2}{3}\right) - 2 \\ &=& 3 \cdot \displaystyle\frac{32}{243} - \displaystyle\frac{16}{81} + 9 \cdot \displaystyle\frac{8}{27} - 3 \cdot \displaystyle\frac{4}{9} + 6 \cdot \displaystyle\frac{2}{3}- 2 \\ &=& \displaystyle\frac{32}{81}-\displaystyle\frac{16}{81}+\displaystyle\frac{8}{3}-\displaystyle\frac{4}{3}+ 4 - 2 \\ &=& \displaystyle\frac{286}{81} \end{eqnarray}
\begin{eqnarray} f\left(-\displaystyle\frac{2}{3}\right) &=& 3 \cdot \left(-\displaystyle\frac{2}{3}\right)^5 - \left(-\displaystyle\frac{2}{3}\right)^4 + 9 \cdot \left(-\displaystyle\frac{2}{3}\right)^3 - 3 \cdot \left(-\displaystyle\frac{2}{3}\right)^2 + 6 \cdot \left(-\displaystyle\frac{2}{3}\right) - 2 \\ &=& - 3 \cdot \displaystyle\frac{32}{243} - \displaystyle\frac{16}{81} - 9 \cdot \displaystyle\frac{8}{27} - 3 \cdot \displaystyle\frac{4}{9} - 6 \cdot \displaystyle\frac{2}{3}- 2 \\ &=& -\displaystyle\frac{32}{81}-\displaystyle\frac{16}{81}-\displaystyle\frac{8}{3}-\displaystyle\frac{4}{3}-4 - 2 \\ &=& -\displaystyle\frac{286}{27} \end{eqnarray}
Logo, das oito possibilidades de raízes racionais, somente uma delas é raiz, o número $\displaystyle\frac{1}{3}$.
Exemplo em vídeo:
Observações importantes:
(a) Como já foi observado anteriormente, o Teorema das Raízes Racionais só fornece as raízes que forem racionais. Esse teorema nem sempre fornece todas as raízes de um polinômio. Se o número de raízes obtidas pelo Teorema das Raízes Racionais for menor que o grau do polinômio, pode ser que esse polinômio possua mais algumas raízes reais que não são racionais. Por exemplo, o polinômio $g(x) = x^3 + x^2-3x-3$ possui as raízes $1$, $\sqrt{3}$ e $-\sqrt{3}$. Ao aplicar o Teorema das Raízes Racionais nesse polinômio, a única raiz que vai aparecer entre as possibilidades de raízes é a raiz $1$. Assim, as outras raízes devem ser determinadas usando outros métodos.
(b) Outra coisa que pode acontecer se o número de raízes obtidas for menor que o grau do polinômio é o polinômio não possuir mais raízes reais. Para ter certeza de que um polinômio não tem mais raízes reais além daquelas obtidas pelo Teorema das Raízes Racionais, outros métodos dever ser usados (veremos isso nas próximas postagens).
(c) Se ao aplicar o Teorema das Raízes Racionais em um polinômio, a quantidade de raízes obtidas for igual ao grau do polinômio, nesse caso e somente nesse caso, essas são todas as raízes reais do polinômio.
Gostou do conteúdo dessa postagem? Foi útil para você? Tem alguma dúvida? Deixe um comentário.
0 Comentários:
Postar um comentário